Tem causado burburinho na imprensa mundial o artigo de Rowland Manthorpe, editor associado da Revista Wired, que lista uma possível morte do buscador do Google (não da empresa como um todo) já em 2016. Nada de novo. Em 10 anos de busca, já li inúmeras vezes sobre o colapso iminente do Google pelas mais diversas razões.
Desta vez, no entanto, o autor tem como base um post recheado de estatísticas do blog Overspill, que demonstra que o número de pesquisas realizadas por smartphone não chega à média de 1 por dia por usuário, enquanto no desktop chega a quase 1,3. Além disso, os termos mais procurados em um dia qualquer são sites ou serviços (como Gmail ou Facebook), o que é desnecessário no smartphone, já que existe um aplicativo para isso.
Num mundo cada vez mais móvel, com vários países já demonstrando taxas de uso acima de 50% em comparação ao desktop (Brasil incluso), isso seria um problema para o Google.Mas será mesmo?
Primeiro, temos que colocar a questão toda em perspectiva: termos mais buscados não significam maioria das buscas. Embora sejam eventos isolados, todos os termos de eventos mais buscados de 2015 (como atentados de Paris, leão Cecil, Star Wars: o Despertar da Força, crise de imigrantes, terremoto no Nepal e outros) somaram alguns bilhões de buscas. Só sobre Paris foram quase 900 milhões, um número que não pode ser ignorado.
Pense só nos outros termos mais específicos, como eventos locais, questões econômicas e políticas brasileiras, aqueles costumeiros, como restaurantes em uma determinada cidade ou bairro, buscas por artigos específicos, dentre outros. Tudo isso, na chamada cauda longa (long tail) resulta em 3,5 bilhões de buscas por dia. Isso mesmo. Bilhões. Por dia. Muito mais que as pesquisas por Paris no auge dos acontecimentos.
Claro que nesses 3,5 bilhões de buscas por dia entram os ditos sites. Facebook, Youtube, Gmail e outros sites e serviços são, sim, termos muito buscados. Muito mais até mesmo que Paris, incluindo aí pesquisas pela Disneylandia, hotéis e restaurantes locais. Mesmo no auge da procura por atentado, os números do Google Trends mostram que Paris não superou o Facebook.
Então essa mudança de comportamento é complicada para o Google, certo? Usuários estão parando de buscar no Google para usar o app do Facebook diretamente, correto? Bom, até está acontecendo, como dá para ver pelo gráfico abaixo. Mas note que essa situação não é nova. Vem lá da década passada. E, no geral, exceto pelo próprio Facebook, não parece que a busca por outros sites tenha mudado muito:
Isso deveria ser péssimo, não? Sem essas buscas, é bastante possível que o buscador perca muitas visitas, que acabe se tornando invisível, que perca bilhões de dólares em publicidade… ou não?
Infelizmente não é mais possível fazer uma pesquisa por um termo exato no Trends, portanto temos Facebook e variantes (como nomes de pessoas e de empresas). Mas na verdade, tais páginas raramente têm anúncios. E quando aparecem, em geral, não geram bons resultados para os anunciantes:
Quem normalmente tira proveito de buscas relacionadas ao portal são blogs que ganham míseros centavos por milhar de visualização no AdSense. Ou especialistas mais sofisticados que ganham um bom dinheiro dando dicas para obter melhores resultados e vender melhor pela plataforma, para um público muito mais especializado. Mas estes não usam query genérica.
E esse último tipo é justamente aquele que tende a ser encontrado por busca orgânica no Google e anúncios pelo adWords. Ou seja, a busca pelo termo principal só gera despesa de tráfego para o buscador, que ganha na cauda longa, nos usos que se podem fazer da ferramenta. Dificilmente alguém investe pesado nessas palavras-chave, por duas razões muito simples:
Ou seja: a ausência de buscas por esses sites não afeta a rentabilidade do buscador, nem constitui palavras-chave relevantes para a grande maioria dos negócios web. Google não vai deixar de existir por isso, nem sua empresa.
Quer uma prova? Os números de busca do Google estão um tanto quanto estacionados desde 2012. Mas em julho de 2015, os fundadores conseguiram aumentar suas fortunas pessoais em US$ 8 bilhões num único dia, devido aos bons resultados da empresa. E o buscador já vale, neste começo de 2016, mais que toda a bolsa de valores brasileira.
Outro detalhe importante é o comportamento do usuário de smartphone. Como o próprio Google define, são usuários vivendo micro-momentos. Quando usando um celular, o usuário está disposto a resolver questões pertinentes para aquele momento. Ele quer saber o que há para fazer na área. Quer esclarecer uma dúvida rápida sobre um determinado assunto. Quer ler sobre algo. Assistir a algo. Quer algo rápido. E isso acaba acarretando em menos buscas, mas muito focadas.
No entanto, deve-se prestar atenção a um detalhe importante: já tentou fazer uma compra em algum e-commerce por um smartphone? Preencher um formulário? Ler um artigo? Escrever um texto em uma caixa de busca?
Por mais que exista uma mudança de plataforma, o fato é que desktops ainda não são indispensáveis. Pode ser que isso ocorra com a popularização dos phablets e celulares de última geração, capazes de entender melhor a fala humana, mas ainda tem muita coisa que os usuários preferem fazer no velho notebook mesmo. Isso, também, acarreta em menos buscas pelos celulares e mais por computadores.
Por fim, a busca não está morrendo. Muito pelo contrário. O Spotlight da Apple e o foco que a Microsoft deu ao Bing no Windows 10 estão aí para mostrar que os principais concorrentes do Google estão de olho nesse mercado. Até o Facebook está preparando melhores buscas.
Estes, sim, são alguns concorrentes que podem tomar uma boa fatia de mercado do buscador e trazer algum risco a ele. Claro que podem surgir outros. No entanto, não há qualquer sinal de que o Google esteja seriamente ameaçado neste terreno. Leia de novo no final de 2016.
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